O mago, a prostituta e o orgulho gay

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Em 1999, Paulo Coelho participou de um festival de literatura na cidade de Mântua, na Itália. Foi surpreendido por uma pessoa que, da platéia, mostrava um cartaz com a seguinte inscrição: Realize meu sonho. Fale comigo um minuto, por favor! Diante do apelo, o famoso escritor não só atendeu o pedido, como aceitou ler o original do livro que ela escrevera. Nascia ali uma das inspirações para o livro Onze Minutos e também uma carreira de escritora. Mariana Brasil não teve medo de expor-se para contar a verdadeira história de uma brasileira que deixa seu país para trabalhar como prostituta na Europa. Seu livro de estréia, O manuscrito de Sônia, recentemente lançado no Brasil (Itália Nova Editora), já é um bestseller na Europa. A autora, atualmente casada e mãe de um filho de 18 anos, participa ativamente de congressos e encontros sobre a questão feminina no âmbito social e de saúde na Itália. Em razão de ter relatado em um dos capítulos de seu livro a história de Francine, uma transexual brasileira que conheceu no passado, foi convidada de honra da presidenta da Arcitrans (Associação Italiana dos Transexuais) de Roma (Leila Daianis) para a festa do Orgulho Gay, ocorrida no último mês de julho e que teve como ícone o presidente espanhol Zapatero, cujo nome era aclamado com um jargão, no mínimo, provocativo: Santo subito! (Santo já!).
Abaixo a entrevista exclusiva para Athosgls:
1) Você diz que seu livro é um mix de ficção e realidade, o encontro com a trans Francine
foi real? Sim, foi um encontro muito importante na minha vida, fez com que eu conhecesse uma realidade até então ignorada, acrescentando muito do ponto de vista humano. Tenho Francine como uma irmã.
2) Depois de Francine, seu ponto de vista sobre os homosexuais mudou. Como os via antes? Como a maioria das pessoas que não conhece essa realidade: tinha reservas. Temos medo do que não conhecemos, e a falta de conhecimento é a grande causa do preconceito e da discriminaçao. Conhecer Francine abriu uma porta de um mundo onde as pessoas enfrentam diariamente uma condição existencial de sofrimento sem culpa. Esse foi um dos motivos pelos quais decidi dedicar um capítulo do meu livro a Francine e sua trajetória de vida. São esses pequenos passos que fazem a diferença e permitem o avanço na caminhada terrena.
3) Você conta que foi testemunha de uma cirurgia que no Brasil ainda é vista como crime. Contudo, já existem hoje, hospitais públicos que dão suporte psicológico para este tipo de intervenção. Como foi esse processo para Francine? Quais eram seus principais dramas? Francine é uma das pessoas mais determinadas e corajosas que conheci na vida. Ela sempre soube o que queria e lutou com todas as suas forças para concretrizar uma adaptação fisica ao seu verdadeiro perfil psicológico feminino. Sempre a vi como uma mulher. Aliás, certas vezes, sua natural feminilidade me fazia sentir um caminhoneiro (com todo o respeito aos caminhoneiros, naturalmente!).Cada caso é unico e depende de muitos fatores, da família, ambiente em que se vive, formação etc… Foi um privilégio conhecer Francine, suas vitórias são para mim grandes alegrias. Não nos vemos muito por motivos profissionais. Atualmente, Francine trabalha e vive em Londres. E é feliz porque realizou seu sonho!
4) Tendo se relacionado tão proximamente com Francine, você pode identificar algumas diferenças entre as dificuldades dos trans na Itália e no Brasil? Vivo fora do Brasil há quinze anos, portanto não sei exatamente como é a realidade atual. Contudo, na minha opinião, o maior problema que enfrentam as pessoas transexuais no Brasil, assim como na Itália e em todo mundo, é a falta de informação, o modo errado como a maioria dos transexuais são apresentados às pessoas. Freqüentemente eles aparecem como personagens ridículos ou violentos. Na TV italiana, são vistos em horários noturnos, em programas exclusivamente dedicados ao mercado sexual. A mídia evidencia somente aspectos bizarros quando se referem a eles, reforçando uma imagem completamente errada sobre a verdadeira realidade e as batalhas que eles enfrentam para obter um lugar digno ao sol.
5) Quais são os direitos reconhecidos dos GLST na Itália? Na Itália a situação dos GLST é muito delicada. São freqüentes os episódios de preconceito declarado, ignorância e discriminação. Recentemente foi negada a carteira de motorista a um rapaz simplesmente por ele ser homosexual. O caso tornou-se público, teve muita repercurssão na mídia e, no entanto, provou somente que ainda há muitos obstáculos a superar, seja para obter a liberdade de viver as escolhas sexuais à luz do dia, seja para conseguir o respeito a que todos os seres humanos têm direito. Quanto às pessoas transexuais, existe uma lei na Itália que garante o direito à cirurgia. Porém, poucas estruturas públicas estão preparadas para dar apoio pisicológico a quem decide fazê-lo. Outro grande problema é a questão dos tratamentos hormonais aos quais devem se submeter por longos períodos: os medicamentos são caros, não são reconhecidos e, naturalmente, não podem ser distribuídos gratuitamente pelos órgãos públicos. Isso significa que as pessoas que querem seguir um tratamento seguro são obrigadas a emigrar. Os obstáculos práticos com que se deparam são muitos, começando com o próprio nome, que é incompativel com a aparência fisica, a dificuldade de encontrar uma casa para alugar, trabalho, estudo, enfim, o elenco poderia ser infinito…
6) Gostaria de acrescentar algo? Sim, gostaria de evidenciar que independentemente das nossas escolhas sexuais, sejam elas quais forem: heteros, homossexuais ou transexuais, não importa, estou consciente das peculiaridades de cada situação, mas sei também que temos em comum uma luta que nos homogeniza: a luta pelos direitos humanos, pela liberdade de amar.
Contato: [email protected]


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