Direito de ser Transsexual

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SExualidade Portugal contabiliza 300 transexuais A maioria não é operada e recorre a tratamentos nem sempre vigiados Processo até à cirurgia é moroso e provoca a desistência
ANDRE KOSTERS / lusaA presidente da associação diz que a transexualidade “é ser-se mulher e ver ao espelho um homem, ou vice-versa”
Leonor Paiva Watson Textos
Espanha prepara uma lei para regulamentar a mudança de identidade de transexuais, em documentos. Por cá, uma parte de nós ainda não sabe o que é um transexual. Na primeira pessoa, “é ser-se mulher e ver ao espelho um homem; ou vice-versa”, diz Jó Bernardo, 40 anos, nascida homem, de alma-mulher e presidente da Associação de Transexuais (AT), que aponta já 300 portugueses nesta situação. Gente que, para ter os genitais que quer, tem que passar por uma maratona hospitalar, sem prazo limite para a conclusão do diagnóstico. “A maioria desiste, não chega à operação”, garante.
É que para o diagnóstico de transexualidade ser válido “é necessário que o indivíduo se submeta a duas avaliações diferentes, pertencentes a centros clínicos distintos. Esse processo dura, no mínimo e obrigatoriamente, dois anos”, esclarece Íris Monteiro, psicóloga clínica da consulta de sexologia do Hospital Júlio de Matos, em Lisboa.
Um número elevado destes pacientes faz viagens entre esta unidade e a de sexologia, do Hospital Universitário de Coimbra. “Os que não desistem, andam nisto, em média, seis anos, num jogo de empata”, aponta Jó. Íris Monteiro contrapõe “Quem percorre o processo, passa uma fase inicial em que é avaliado nos dois locais, mas, depois, mantém-se num só centro”. Admite, no entanto, que “a fase inicial é de tempo variável, dependente de cada caso”.
Por isso mesmo, admite Jó, “muitos nem sequer se sujeitam a tal experiência e preferem ser operados no estrangeiro; ou viver – por falta de dinheiro também – com o sexo que têm e alguns tratamentos hormonais”.
De facto, num universo de 300 transexuais, apenas 45 frequentam a psicoterapia do Júlio de Matos, fazendo a devida correspondência com Coimbra; e “apenas três, em dez anos, apareceram no Hospital de S. João, no Porto”, revela Pacheco Palha, médico fundador da consulta de sexologia naquela unidade hospitalar. Os restantes hospitais do país com este tipo de consulta registam, igualmente, um número muito inexpressivo de pacientes.
“Tudo isto está integrado no Sistema Nacional de Saúde (SNS) e, portanto, as consultas, bem como a operação, são pagas pelo Estado. Mas quem é que nos paga as viagens? Não podemos esquecer que muitos transexuais não têm acesso ao mercado de trabalho”, alerta Jó, recordando que efectou inúmeros trabalhos como tradutora “free-lancer”, para uma empresa no Algarve, até ao dia em que apareceu no escritório.
Agirem de acordo com a sua identidade psicológica é uma das fases obrigatórias do processo clínico. “Se nos sentimos mulheres, então, temos que nos vestir e agir como tal”, avança. A psicóloga explica “É um teste denominado de ‘Vida Real’, com a duração mínima de um ano, no qual se testa como o paciente vai encarar a família, o trabalho, a sociedade”.
“É complicado. Imagine que até se vai para o trabalho vestido de uma forma híbrida e, de repente, tem que começar a ser feminina. Claro que vai haver reacções. A maioria não se aguenta no emprego. As pessoas julgam-nos e julgam que nós somos assim porque queremos. Se pudesse escolher, escolheria ser normal”, confessa Jó.
Daqui à prostituição pode ser um passo. “É sobrevivência. Precisamos para comer e para chegar ao nosso sonho, mudar de sexo. Eu fui prostituta 18 anos”, retrata. Íris Monteiro alerta para o facto de não devermos associar a transexualidade à prostituição. “Dos casos clínicos que acompanho pouca frequência dessa práctica verifico”, garante. Jó refuta “É que a maior parte dos transexuais que vão às consultas são os que querem ser homens sendo mais aceites culturalmente”.
Enquanto presidente da AT, Jó dá assistência a uma média de 15 transexuais, passando o apoio pelo “aspecto legal”, podendo ir até ao acompanhamento hormonal. “Temos uma endocrinologista”. O tratamento endocrinológico é outra das fases (contínua) obrigatórias do acompanhamento no SNS e, muitas vezes, surge em paralelo com o teste da ‘Vida Real’, que é, defende Íris Monteiro, “gradual, para evitar o choque”.
Jô insiste na morosidade de tudo isto e no facto de que muitos desistem, não chegando a ser operados. E, em Portugal, sem a cirurgia não se pode mudar o nome, por exemplo, de João para Joana…


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