Moda das festas gays flutuantes volta com força a Nova York

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‘Viagens’ são embaladas por hits de nomes como Spice Girls e Miley Cyrus

Por Christopher Barnard, The New York Times

Ty Sunderland andava de lá para cá, a cabeça inclinada, a concentração toda sobre o celular. Eram 17h52, faltavam oito minutos para que os 500 convidados que esperava subissem a bordo da embarcação da Circle Line Sightseeing Cruises, onde ofereceu uma festa em 18 de junho, e o sistema de som ainda não tinha sido ajustado. O DJ e organizador de eventos de 32 anos que vive no Brooklyn já começara a mandar mensagens de texto para um engenheiro. A questão ameaçava com turbulência o início de “Gayflower: Spice Girls”, acontecimento inaugural da temporada anual de festas flutuantes que começou em 2018 e ganhou nome inspirado no Mayflower, navio que saiu com os peregrinos da Inglaterra rumo a Plymouth, em Massachusetts, em 1620.

Desde a concepção, cada evento é uma homenagem a um nome do pop, tanto na música quanto nas roupas. Os convidados, na grande maioria homens gays, geralmente chegam em trajes inspirados no artista que está sendo celebrado. Enquanto o engenheiro de som terminava de acertar os alto-falantes, Sunderland confessou como esperava que os convidados honrassem o grupo de garotas britânicas do pop dos anos 90 que ficou conhecido por sucessos como “Wannabe” e “Spice Up Your Life”, composto orginalmente por Scary, Sporty, Ginger, Baby e Posh.

— Quero ver quintetos, quero ver referências, quero ver vestidinhos Gucci — começou ele, referindo-se aos modelitos pretos usados por Posh, nome de palco de Victoria Beckham, que trocou a carreira de Spice Girl pela de estilista. — Ela é sinônimo de moda. Eu adoro, e ela sempre foi referência — completou Sunderland, que já tinha sido assistente do departamento de compras da loja de departamentos Barneys New York antes de se tornar figurinha carimbada na noite.

Contou também que começou a usar preto e branco porque as cores ajudavam a reconhecê-lo nas casas noturnas, e pensara em usar um minivestido preto naquela noite, mas acabou optando por um dos quase cem bonés da Stampd que possui, em preto e branco, uma calça de agasalho Adidas no mesmo contraste e uma jaqueta preta da Nike sobre a camiseta das Spice Girls. As peças separadas, concluiu, eram mais apropriadas para quem ficaria nas picapes, em mar aberto, a temperaturas que podiam chegar a 15 °C.

DJ Ty Sunderland, que organiza a festa “Gayflower: Spice Girls” em barco em Nova York — Foto: Jonah Rosenberg/The New York Times

DJ Ty Sunderland, que organiza a festa “Gayflower: Spice Girls” em barco em Nova York — Foto: Jonah Rosenberg/The New York Times

Mas a praticidade não era grande preocupação para os convidados, que conferiam Manhattan depois de embarcar no Píer 83 do Rio Hudson. Ivan Lizardi, de 27 anos, outro fã de Posh Spice, usava um pretinho básico que comprara na Zara.

— Posh é minha favorita porque é a que menos se esforçava; só ficava ali, sentada, sendo bonita. Minha cara! — disse ele, que trabalha na plataforma de streaming Paramount+.

Sean Riordan, de 30 anos, que saíra da Califórnia para fazer ali sua despedida de solteiro, vestia uma roupa que todo fã do grupo reconhece: um vestido estampado com a bandeira britânica, famoso no corpo de Geri Horner, a Ginger Spice.

— Sou fã desde criança. Tenho roupa de cama… Minha primeira Barbie foi a Spice Girls. Meu pai quase surtou quando soube — contou ele, que trabalha na administração de um hospital.

Vestidos a caráter ou não, muitos foram atraídos para o evento pela nostalgia e pelo desejo de celebrar o “girl power” (“poder feminino”), grito de guerra das meninas. Tim Fitzgerald, de 27 anos, vestido mais adequadamente para o tempo frio — jaqueta de couro, moletom com capuz e calça (tudo preto) —, revelou o impacto de “Spice World”, filme de 1997 estrelado pelo quinteto, sobre ele quando ainda era garoto.

— Vi o filme com meu melhor amigo até a fita de VHS arrebentar— admitiu o relações-públicas da marca Coach.

Cada convidado pagou até US$ 55 para participar do cruzeiro de quatro horas, praticamente só embalado pelas músicas dos três álbuns lançados pelo grupo: “Spice”, “Spiceworld” e “Forever”. (O último foi gravado sem Ginger, que saiu em 1998 para investir na carreira solo.) Lá pelo meio da festa, o dançarino e drag queen Brie Bordeaux se apresentou, usando um minivestido pink que descreveu como uma mistura de “Baby Spice e Elle Woods”.

Intercalando as canções do grupo e o show de drag, ouviam-se as músicas dos outros artistas homenageados nas festas anteriores, incluindo Lady Gaga e Britney Spears – que, aliás, foi a inspiração para o primeiro evento Gayflower de Sunderland, em meados de 2018. Chamado “É a Britney, Barco”, o acontecimento, que ele descreve como “carro-chefe” da série, é repetido todo ano.

Mesmo quem nunca esteve em uma talvez tenha ouvido falar por causa da edição de 2021, em homenagem à cantora, que teve um incidente com um desordeiro e acabou inesperadamente viralizando nas redes sociais. “Teve um ‘bofe do capeta’ (‘demon twink’) no barco da Britney ontem à noite que jogou bebida na picape, recusou-se a sair do palco até eu parar de tocar…”, tuitou Sunderland no dia seguinte à festa, usando o termo usado para descrever homens gays bem jovens, magros e sem pelo no corpo, completando a descrição com outras transgressões impublicáveis.

A postagem provocou respostas, inclusive uma com o anúncio falso de que o personagem estaria em uma nova série da Netflix, e outra que sugeria uma coleção de roupas e itens para os gays desse perfil. (Já há regatas cropped com a expressão estampada à venda no Etsy, aliás.)

O incidente foi mencionado este mês em um episódio de “Ziwe”, o talk show do Showtime.

— Foi minha pequena contribuição ao léxico gay. Agora todo mundo sabe o que significa, e os héteros descobriram o que faço — concluiu ele.

Quando, porém, a viagem das Spice Girls foi promovida, o espectro já tinha sido exorcizado das festividades — e, com a exceção de alguns mais intrépidos que subiram nos contêineres de coletes salva-vidas quando o navio já voltava para o porto de partida, a grande maioria se comportou bem.

Embora seja impossível prever qualquer presença demoníaca no futuro, o destino da série de festividades está mais assegurado, segundo Sunderland, que também é o apresentador de Ty Tea, evento regular em terra firme, na casa 3 Dollar Bill, no Brooklyn, aos domingos.

Este ano ainda estão previstas outras cinco excursões, incluindo “Gayflower: Bangerz”, para os fãs de Miley Cyrus, que se efetuou em 24 de junho, e a reedição de “É a Britney, barco”, marcada para 30 de julho:

— Essa eu vou continuar fazendo até os 50 anos. Se tiver público, estou zarpando.

O Globo


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