Comunidade LGBT+ na Hungria: um “ambiente ameaçador” onde não são respeitados Direitos Humanos?

0

David McNew

Um grupo de constitucionalistas da Comissão de Veneza, órgão consultivo do Conselho da Europa, considera as restrições à discussão sobre orientação sexual e identidade de género “incompatíveis com os padrões de direitos humanos a nível internacional”.

Especialistas em Direito Constitucional da Comissão de Veneza, órgão consultivo do Conselho da Europa, publicaram um parecer relativo à compatibilidade da Lei LXXIX (89) do Parlamento húngaro, aprovada em junho, com os padrões e as normas internacionais sobre Direitos Humanos da comunidade LGBT+.

O parecer avalia as alterações legislativas na Hungria sobre a liberdade de receber e divulgar informações sobre direitos e liberdades da comunidade LGBT+ no país, nomeadamente em relação a questões de orientação sexual e identidade de género.

Em causa estão restrições a discussões e abordagens a estes temas na esfera pública, nomeadamente em escolas e na comunicação social.

O Parlamento húngaro pretende limitar o acesso a conteúdos que “propaguem ou retratem divergências de identidade própria correspondente ao sexo do nascimento, a mudança de sexo ou a homossexualidade”, a menores de 18 anos.

A Comissão de Veneza lamenta, ainda, a forma “precipitada” como esta lei foi aprovada, sem consulta pública à população do país, à oposição parlamentar e a outras partes interessadas, o que, alega, viola as recomendações da Comissão.

Sobre o conteúdo da lei, os constitucionalistas referem que considerações de “moralidade pública” ou “proteção de menores” não podem justificar as restrições a direitos e liberdades relativas à divergência entre a identidade dos cidadãos e o respetivo sexo no nascimento, mudança de sexo ou outras orientações sexuais diferentes da heterossexualidade.

Relembram ainda que o género, tratando-se de uma importante componente da identidade pessoal, mas também as orientações sexuais que não correspondam à homossexualidade, são protegidas pela Convenção Europeia dos Direitos Humanos (CEDH).

Isto leva, de acordo com a Comissão de Veneza, a que as considerações “contrárias à moralidade”, invocadas pelo Parlamento, sejam incompatíveis com a norma do artigo 10, n.º 2 da CEDH.

Acrescentam ainda que se trata de uma lei incompatível com a própria jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, que reconhece a identidade de género como um componente da identidade pessoal, enquadrando-se no direito ao respeito pela vida privada.

Desta forma, os especialistas apontam que as alterações efetuadas pelo Parlamento húngaro à Lei Nacional de Educação Pública não se encontram de acordo com os padrões internacionais de Direitos Humanos, desrespeitando a obrigatoriedade do país em garantir que o sistema educacional forneça às crianças informações objetivas – “e não tendenciosas” – sobre identidade de género e orientação sexual, ao mesmo tempo que as protege de fenómenos de discriminação por tais motivos.

Pelo contrário, a Comissão de Veneza aponta que estas alterações contribuem para a criação de “um ambiente ameaçador, onde as crianças LGBT+ podem estar sujeitas a riscos de saúde, intimidação e assédio”.

UMA LEI POLÉMICA ANTES DE ENTRAR EM VIGOR

A polémica lei, aprovada a 15 de junho e num momento em que o Governo conservador de Viktor Orbán multiplica as restrições à comunidade LGBT, foi promulgada a 23 de junho pelo Presidente húngaro, János Áder.

 

O Presidente da Hungria, János Áder.

O Presidente da Hungria, János Áder.

NurPhoto

 

A norma foi redigida contra a pedofilia, contudo, antes de a votação ser levada a cabo, foram acrescentadas disposições relativas à homossexualidade, segundo a agência noticiosa espanhola EFE.

Na altura, Áder afirmou que a nova legislação não contém qualquer disposição que determine como deve viver um maior de idade e não fere o direito ao respeito da vida privada, consagrado na Constituição.

A REAÇÃO EUROPEIA

Contudo, opinião diferente teve a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que referiu que a União Europeia iria utilizar “todos os instrumentos disponíveis” para defender os “princípios fundamentais”, na hipótese de não existir uma correção da lei por parte do Estado húngaro.

Na altura, Von der Leyen explicou que a lei impede que “filmes, notícias ou publicações onde figurem lésbicas ou homossexuais sejam mostrados a menores de 18 anos”, tendo em conta a opinião de que tais “informações têm repercussões negativas no desenvolvimento físico e mental dos menores”.

Vários líderes europeus, de países como a Alemanha, França, Itália ou Espanha, escreveram uma carta ao Presidente húngaro, na qual apresentam críticas à lei, classificando-a como discriminatória.

Já o Parlamento Europeu, numa resolução aprovada com 459 votos a favor, 147 contra e 58 abstenções, aponta que a lei em causa constitui uma “violação clara dos direitos fundamentais” da União Europeia, sublinhando que não se trata de um “incidente isolado” no panorama húngaro.

 

O Parlamento Europeu.

O Parlamento Europeu.

FREDERICK FLORIN

 

O órgão comunitário apelou ainda a que os Estados-membros levassem a questão ao Tribunal de Justiça da União Europeia, lançando, igualmente, um “pedido interestadual ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem”.

O primeiro-ministro holandês, Mark Rutte, foi mais longe e desafiou Budapeste a abandonar o bloco europeu por não respeitar os valores da União Europeia.

Em resposta, Viktor Órban apontou que foram feitas “declarações graves e antidemocráticas em relação à lei de defesa de menores, que cruzaram a linha vermelha”, sendo que o Governo húngaro reitera que as críticas “recordam as atitudes colonialistas e refletem uma atitude de superioridade”.

O PERFIL DE ÓRBAN

O primeiro-ministro húngaro é descrito como um dos maiores bastiões da extrema-direita internacional e europeia.

O primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán.

O primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán.

FERENC ISZA

 

É conhecido por visões caracterizadas pelos valores do conservadorismo, do nacionalismo, da anti-imigração e do ceticismo em relação à União Europeia.

O seu Governo, caracterizado, por muitos, como “iliberal” e com tendências autoritárias, levou a que, na Hungria, se tenha assistido, num passado recente, ao enfraquecimento de instituições democráticas, à restrição e censura na comunicação social – e não só – e à perseguição a opositores políticos.

SICNotícias


Deixe um comentário ou dica do que gostaria que pudéssemos trazer de novidade para vocês. E se curte nosso CANAL faça uma doação de qualquer valor para que possamos continuar com esse trabalho.

PIX: (11) 98321-7790
PayPal: [email protected]

TODO APOIO É IMPORTANTE.

Compartilhar.

Sobre o Autor

DEIXE UM COMENTÁRIO

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.