As vicissitudes do mundo gay

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Tudo muda. Isso é uma grande realidade. As coisas mudam o tempo todo. Mas de perto, as coisas podem ser diferentes. As coisas mudam, mas nem tanto. O mundo muda, mas nem sempre o suficiente para evitar a mesmice cotidiana. “Plus ça changeplus c’ést la même chose“. O nosso mundo é banal,  pouca coisa parece ter raiz em algo mais profundo do que a rasa superfície da aparência. Talvez isso incomode mais no mundo gay que em qualquer lugar.

Bauman, estudando a afetividade e os relacionamentos em tempos de modernidade líquida, aponta para o constante ausentar-se do sujeito até mesmo das coisas em que ele é imprescindível. O sujeito do mundo moderno, cheio de olhos eletrônicos, mensagens rápidas, chamadas de vídeo é também um sujeito que se afasta do compromisso. No universo LGBTQIA+, os relacionamentos caminham por vias específicas. A perspectiva da formação de famílias nucleares é muito diferente e parece ser mais uma alternativa à morte em solidão absoluta do que, exatamente, um projeto de vida que se liga, automaticamente, a uma estratégia de controle populacional nascida na modernidade após as revoluções burguesas contemporâneas da Europa. Ou seja, o corpo inútil e indócil de homossexuais e pessoas trans, inadequados aos tipos tradicionais e sacralizados de reprodução humana, nem precisariam passar pelo constrangimento de se sufocarem dentro de estruturas socioculturais imutáveis, ou pelo menos de difícil mutação.

Então, pensar o mundo através dessas estruturas nem é obrigatório, embora alguns queiram. A plasticidade do mundo contemporâneo permite esse tipo de empréstimo de significados. Não precisamos exatamente procriar, não precisamos exatamente formar uma família cujo objetivo é criar mão-de-obra trabalhadora.

Mas certamente precisamos ser felizes, e o grande ganho do mundo capitalista foi associar o erotismo, o respeito, a felicidade e uma série de valores à vivência em família. Ficamos tristes, nós LGBTQIA+ quando somos preteridos em nossos meios familiares, ficamos tristes quando nos deparamos com a solidão das relações líquidas ou mesmo quando temos que usar nossos corpos em esquemas rígidos de economia do prazer. Porque tudo nos deixa insatisfeitos. E quanto mais a sociedade muda, quanto mais as coisas sólidas se sublimam, ou liquefazem, ou ainda mudam, mais elas se tornam as mesmas. No fim, tudo acaba em solidão, porque se morre só, mesmo cercado de gente por todos os lados, mesmo no seio de uma grande e sólida família, nada é mais solitário do que encarar a morte, o fim de tudo.

Portanto, talvez o melhor seja que buscássemos ser felizes, mesmo que isso significasse ser feliz num ponto fora das curvas mais comuns. Talvez as relações líquidas, as transas de vinte minutos e não mais falar com a pessoa, talvez a relação de dez quinze anos já não sejam mais o suficiente. Talvez combinar tudo isso numa vida só não seja o suficiente. Mas algo é mais que certo. Nós LGBTQIA+ precisamos nos bastar, encontrar nossos caminhos, livres da condenação ou bênção de deuses que não nos amam, livres da suspeição de uma sociedade que nos cobra frutos biológicos ou ainda uma normalidade que dói em nossas pelas e mentes. Sejamos nós mesmos, felizes, ainda que sós.

Por Alex Mendes

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