Comunidade LGBT+ continua a deparar-se com restrições em Macau

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Em Junho, comemora-se o orgulho e a cultura de pessoas lésbicas, gays, bissexuais e transgénero. O índice de discriminação para gays é pelo menos 10% maior do que todos os outros grupos de orientação sexual, revela Inquérito LGBT+ de Macau 2019 promovido pela Associação Arco-Íris de Macau.

Gonçalo Lobo Pinheiro

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Durante o mês de Junho, a comunidade LGBT+ espalhada pelo mundo aposta numa série de eventos que servem de afirmação nas sociedades, muitas delas ainda retrógradas, carregadas de conservadorismos.

Fomos sentir o pulso à comunidade que ainda, aqui e ali, tem algum receio em dar a cara. Em Macau, apesar de se tratar de uma sociedade fechada, não há qualquer evento para comemorar o mês do orgulho LGBT+, assumiu o líder da Associação Arco-Íris de Macau, Anthony Lam, ao PONTO FINAL.

Lam fala-nos que ainda existe muita discriminação para com a comunidade LGBT+ em Macau. “O índice de discriminação para gays é pelo menos 10% maior do que todos os outros grupos de orientação sexual”, começou por dizer ao nosso jornal, concretizando em seguida: “O Inquérito LGBT + de Macau conduzido pela nossa associação em 2019 revelou que, numa escala de 1 a 10, os homossexuais sofriam de cerca de 7,5 pontos de discriminação subjectiva, que era a mais elevada entre todos os grupos de orientação sexual. Por outro lado, uma percentagem maior de gays (38,5 por cento) já sofreu agressão verbal por causa de sua orientação sexual”.

O macaense Roberto Nuno Kan também constata que existe discriminação no território. “Existe, mas não é nítida. Felizmente, não existe violência, mas claro que existem alguns comentários desagradáveis, como em qualquer parte do mundo”, explicou ao PONTO FINAL.

Roberto, ainda assim, mostra-se esperançoso devido às novas gerações do território. ”Há mais tolerância nesse aspecto devido à troca de cultura quando vão viajar para outros países. A educação sexual de hoje não é a mesma que a dos anos de 1990, nem dos anos 2000. Hoje, há muito mais divulgação, e graças à Internet, praticamente toda a informação necessária sobre a comunidade LGBT+ está disponível. As coisas estão a melhorar pouco a pouco, mas o progresso é lento”, constata o homem de 29 anos.

Em total contraponto surge o depoimento de Kia Salgado. A portuguesa revela-nos que a sua vida nunca foi muito difícil neste particular. “Nunca tive problemas no seio familiar, no trabalho ou na comunidade por ser gay”, assume, constatando que quando ouviu bocas, “estava na Europa”. “Em Macau, nunca ouvi nada. Se dizem alguma coisa sobre o facto de andar de mão dada na rua com a minha namorada, dizem-no nas costas”.

Homossexuais e bissexuais infelizes

E como se sente um homossexual em Macau? Está a cidade preparada para a comunidade LGBT+? Anthony Lam volta a trazer os dados da sondagem de 2019 para explicar o fenómeno. “O estudo da Arco-Íris descobriu que, quando classificados por eles próprios, os homens gays e os homens bissexuais, em média, tinham apenas 4,3 em uma escala de 10 pontos que mede o seu índice de felicidade. O mesmo estudo conclui ainda que o índice de felicidade estava em proporção directa com a aceitação da família, enquanto em proporção indirecta com a discriminação social subjectiva”, nota o líder da Associação Arco-Íris de Macau.

O suicídio também atormenta a vida da comunidade LGBT+. Anthony Lam refere que 18,9% dos gays tiveram pensamentos suicidas com base na sua orientação sexual, em comparação com o percentual geral de 14,1%. Já em relação aos homens bissexuais, 17,6% já tiveram pensamentos suicidas. “Consideramos ambas as descobertas preocupantes”, assume.

Roberto Kan fala mesmo numa vida cheia de restrições. “Em Macau, as pessoas não podem ser quem são a 100%”, desabafa o macaense que considera que há sempre um certo “medo de que as pessoas falem de nós de forma negativa”. “Macau é muito pequeno, mas mesmo assim a população não tem acesso à comunidade LGBT+ devido a haver pouca divulgação”, nota.

Para Kia Salgado, “as mulheres não sofrem tanto quanto os homens”. “É o que sinto, mas como não me envolvo na comunidade LGBT+, não tenho um conhecimento profundo da questão”.

A portuguesa revela que nunca concordou com etiquetas, por isso também não é de andar com bandeiras gays na mão. “Não me junto a grupos por causa de orientações ou gostos, porque vejo a sexualidade com muita normalidade. Decididamente, não é por ser lésbica que tenho de fazer parte da comunidade”, nota.

Progresso jurídico pode ser a chave

Anthony Lam acredita que o Governo deveria fazer muito mais “para apagar estigmas relacionados com orientação sexual e as minorias de identidade de género”. “Acreditamos que o progresso jurídico nesta matéria será uma forma para melhorar a situação actual”, sugere.

Para isso, a comunicação social “tem um papel tão importante quanto o sector da educação”. “Têm o poder de melhorar ou piorar a opinião pública sobre o assunto. Estamos mais do que felizes por ter discussões com os média sobre como podemos fazer de Macau uma cidade mais amigável para todos”, referiu Anthony Lam.

Mais divulgação também é o que pede Roberto Kan. No ano passado, um grupo de pessoas criaram um grupo que se chama “Macau LGBTQ+ Social Club”. “Isto foi criado porque em Macau não havia qualquer tipo de actividade sobre o assunto”, explicou Kan ao PONTO FINAL.

O grupo começou com 15 pessoas e hoje tem mais de 300 devido aos diversos eventos organizados, adicionou ainda o macaense. Roberto Kan considera que, de certa forma, “foi uma maneira de as pessoas terem o conhecimento sobre o assunto e também poderem ter uma mente mais aberta e estarem bem com “gays” à volta, porque na verdade somos todos humanos”. “A sexualidade de cada um não nos define. E no final das contas, há pessoas para todos os gostos e feitios. Posto isto, é só uma questão de aceitar e respeitar”.

“Sem direitos quase nenhuns” é que diz Kia Salgado quando questionada sobre o que é preciso melhorar. “Há muito para fazer, em especial em Macau e na China continental. As coisas vão acabar por acontecer, mais tarde ou mais cedo, mas vai demorar muito. É com muita alegria que vejo o que se passa, por exemplo, em Taiwan”, saúda a portuguesa.

Junho tornou-se o mês do orgulho LGBT+ depois das manifestações e movimentos gays do final dos anos de 1960 nos Estados Unidos da América, principalmente com a chamada rebelião de Stonewall.

Aquela altura ficou especialmente marcada como um momento crucial nos movimentos LGBT+ e hoje, um pouco por todo o mundo, em Junho acontecem as chamadas paradas do orgulho LGBT+ que acabam por ser eventos de afirmação do orgulho da comunidade.

Ponto Final Macau

Macau Situa-se na costa meridional da República Popular da China, a oeste da foz do rio das Pérolas e a 60 km de Hong Kong, que se encontra aproximadamente a leste de Macau. Faz fronteira a norte e a oeste com a Zona Económica Especial de Zhuhai, logo é adjacente à província de Cantão.


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