Embate entre igrejas e direitos LGBTQ já tem ganhador

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Conservadores religiosos dos EUA politizam e judicializam questões que poderia ser resolvidas em acordos

Thomas Reese*
NCR

Líderes da Igreja Católica e igrejas cristãs evangélicas lutaram com unhas e dentes contra a expansão dos direitos LGBTQ, no que se refere a uniões homoafetivas, benefícios para cônjuges resultante dessas uniões ou não discriminação no emprego.

Apesar de gastar milhões de dólares em campanhas de mídia e honorários legais, eles perderam consistentemente no Supremo Tribunal dos EUA, onde esses casos são inevitavelmente decididos. Os conservadores também estão perdendo no tribunal da opinião pública, onde os estadunidenses, especialmente jovens, na atualidade, apoiam fortemente os direitos LGBTQ.

Os líderes eclesiais deveriam ter visto isso acontecer e seguido o conselho de Jesus:

“Qual é o rei que, pretendendo sair à guerra contra outro rei, primeiro não se assenta e pensa se com dez mil homens é capaz de enfrentar aquele que vem contra ele com vinte mil? Se não for capaz, enviará uma delegação, enquanto o outro ainda está longe, e pedirá um acordo de paz. Da mesma forma, qualquer de vocês que não renunciar a tudo o que possui não pode ser meu discípulo” (Lc 14, 31-33).

Os mórmons mostraram o caminho sentando-se secretamente com legisladores estaduais e ativistas gays para elaborar um compromisso que se tornou lei no estado de Utah. O acordo não fez todos felizes, mas o que faz na prática?

Em vez de buscar um diálogo para um acordo, os conservadores religiosos apostam toda a sua credibilidade no Partido Republicano e no presidente Donald Trump, que prometeu nomear juízes que reverteriam a expansão dos direitos dos gays. Essa tem sido uma aposta cara, que afastou milhões de jovens do cristianismo. É uma aposta que falhou.

Os bispos católicos também foram mal aconselhados pelos especialistas em ética e advogados que consultaram. Os primeiros proibiram o acordo e os segundos prometeram vitórias.

Outros especialistas em ética observaram que o compromisso político era reconhecido como legítimo desde pelo menos a época de São Tomás de Aquino. Este desaconselhou legislar uma conduta moral perfeita. O santo entendeu que, a menos que as leis fossem apoiadas pela maioria dos cidadãos, elas não seriam observadas. Ele e Santo Agostinho até chegaram a tolerar a prostituição legalizada.

Em vez de negociar compromissos com a comunidade gay, os conservadores religiosos lutaram até o fim.

Líderes eclesiais têm dificuldades em reconhecer a derrota. Uma vez que pensam que estão travando a batalha de Deus, o pensamento de rendição é inconcebível. Mas render-se aqui não significa abandonar o ensino da Igreja, significa abandonar as tentativas de usar o Estado para impor esse ensino às pessoas.

A lista de tentativas fracassadas de usar o Estado para apoiar o ensino da Igreja é longa.

Os líderes protestantes lutaram pelo uso de sua Bíblia e orações nas escolas públicas, mesmo depois que católicos e judeus se tornaram partes significativas do corpo discente. Muitas dessas mesmas denominações pressionaram pela proibição e depois lutaram contra sua revogação.

As Igrejas lutaram contra a legalização do divórcio, especialmente o “divórcio sem culpa”, em que a dissolução de um casamento não exige a demonstração de irregularidades por nenhuma das partes. Os bispos católicos lutaram contra a legalização do controle de natalidade. A luta pelas chamadas leis azuis, que proíbem a abertura de negócios e entretenimento aos domingos, foram defendidas pelos líderes da Igreja há muito tempo e tinham amplo apoio. Outros muitos líderes eclesiais apoiaram a censura de alguns filmes e livros. A expansão dos direitos das mulheres também foi contestada por algumas Igrejas.

Todas essas lutas foram perdidas pelos líderes conservadores da Igreja que falharam em entender o humor do país ou da Constituição da forma como é interpretado pelos tribunais. Mas, em vez de entrar em negociações, como Jesus recomendou, demonizaram seus oponentes e lutaram.

Chegou a hora dos conservadores religiosos admitirem a derrota – talvez já seja hora de negociar bons termos para sua rendição. Eles queimaram muitas pontes ao longo do caminho para derrotar. Como resultado, os ativistas liberais podem muito bem esmagar os conservadores religiosos, mobilizando-se para acabar com as exceções religiosas existentes, projetadas para acomodar as consciências conservadoras.

As Igrejas precisam reconhecer que permitir que os gays se casem civilmente não trouxe o fim do mundo ou prejudicou o casamento heterossexual. Pelo contrário, pode estimular heterossexuais a se casar, em vez de simplesmente viverem juntos “em pecado”.

Todavia, mesmo na derrota, a Constituição protege os conservadores religiosos de serem forçados a realizar casamentos gays em suas igrejas. Eles também podem continuar ensinando que o sexo gay é um pecado, assim como ensinam que o sexo heterossexual fora do casamento é também pecado.

Os conservadores de diferentes Igrejas não precisam ter ministros gays, embora quem é ministro gay e está dentro de uma Igreja em particular possa abrir processos jurídicos para sua defesa, o que, por sua vez, torna as disputas mais tóxicas. A Suprema Corte deixou muitas questões não resolvidas em sua recente decisão contra a discriminação de pessoas LGBTQ no trabalho, que poderão ser apresentadas no tribunal no futuro. No entanto, não seria melhor resolver essas divergências por meio de negociações, em vez de litígios?

O compromisso é possível? Espero que sim, mas não sou otimista.

Ambos os lados precisam lembrar que trabalhar nos tribunais e no poder executivo é uma coisa imprevisível. As administrações vêm e vão, enquanto os juízes são incertos. Não seria melhor preservar seus valores mais queridos da montanha russa da política eleitoral? Não seria melhor resolver os conflitos menos importantes por meio de negociações, em vez de passar anos em caras batalhas judiciais?

A continuação dessas batalhas beneficia apenas advogados e organizações que usam esses conflitos para ganhar dinheiro. Negociar compromisso é a maneira estadunidense e cristã de proceder. Espero que não seja tarde demais.

Publicado originalmente por NCR

*O padre jesuíta Thomas Reese é colunista do Religion News Service e autor de Inside the Vatican: The Politics and Organization of the Catholic Church

 

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