Proprietário de escola de alto padrão é acusado de homofobia

0

Arthur Gandini

O proprietário e diretor-geral de uma escola de alto padrão em Santo André, Daniel Contro, tem sofrido acusações de homofobia após reunião realizada com pais de alunos no dia 3. Trata-se do Colégio Liceu Jardim, na Vila Guiomar. Segundo nota de esclarecimento divulgada pela instituição, o encontro ocorreu com o objetivo de discutir os desafios da retomada das aulas presenciais e o impacto psicológico da pandemia sobre os estudantes do 6º, 7º e 8º anos do ensino fundamental.

Entretanto, áudio da reunião foi divulgado pelo perfil no Instagram Régua Enem e o conteúdo passou a ser alvo de críticas nas redes sociais. Pais de alunos que conversaram com o Diário também reclamam de posições defendidas na reunião. Contro fez críticas à chamada “ideologia de gênero”. O termo é utilizado por movimentos políticos conservadores para definir o pensamento dos movimentos sociais que pedem tolerância aos LGBTQIA+ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais, Travestis, Queer, Intersexo e Assexuais) e o debate da sexualidade no ambiente escolar. “Não temos nada contra quem tem opção homossexual. É um direito de cada um, a escola não vai interferir na escolha de ninguém. E nesta escola, dentro do nosso ideário pedagógico, há conjunto de valores dos quais não abriremos mão. Isso não será admitido como normal”, disse Contro aos pais.

O diretor questionou a liberdade de existência de relações homoafetivas. “Eu queria que alguém apontasse qual o benefício em se liberar isso. Em uma festa aqui nessa escola meninas acariciaram meninas e meninos acariciaram meninos. E, para eles, está muito natural isso. É moderno, liberou, agora é assim”, relatou.

Contro afirmou que há famílias que retiraram alunos do colégio e que o classificaram como “quadrado” e homofóbico. Declarou que “talvez não seja essa a escola para os filhos (desses pais)”. O empresário defendeu que a homossexualidade surgiu a partir da corrente de pensamento alemã conhecida como Escola de Frankfurt, que também teria relação com criminosos, operários e ciganos. O dono da escola ainda elogiou o governo de países que se posicionam contra a união de LGBTQIA+. “Isso não existe no Oriente, é só no Ocidente. Há o discurso nacional do (presidente da Rússia Vladimir) Putin se posicionando contra a ideologia de gênero. A China não está assim. Você acha que o Islã tolera isso?”, declarou.

Desde junho de 2019, após decisão do STF (Supremo Tribunal Federal), o preconceito contra pessoas LGBTQIA+ passou a ser considerado crime com a pena de reclusão de um a três anos, além de multa. Já o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), em seu artigo 232, prevê a pena de detenção de seis meses a dois anos para quem submeter os jovens “sob sua autoridade, guarda ou vigilância a vexame ou a constrangimento”.

O advogado Ariel de Castro Alves, especialista em direitos humanos, avalia que o diretor pode responder criminalmente pelas declarações. “Ele pode dar opiniões com relação à erotização e sexualização, mas não pode pregar ódio e intolerância como fez. A fala dele é atentória aos direitos humanos previstos na Constituição Federal, como da igualdade, liberdade e dignidade da pessoa humana”, acrescenta.

PADRÃO LICEU
O Diário ouviu relatos de pais e estudantes sobre o ambiente escolar do colégio. Eles pediram a condição de anonimato com o receio de sofrer represálias da direção. Uma aluna afirma que foi ameaçada de advertência por inspetores, em maio, após andar de mãos dadas com a sua namorada no pátio do colégio. A jovem diz ter desenvolvido crises de ansiedade por conta do ocorrido e que o mesmo tratamento não é dado a casais de alunos heterossexuais.

‘A mãe de um ex-aluno negro diz que o filho chegou a sofrer racismo na instituição. Em um dos casos, teria sido ameaçado por outros alunos de agressão e seguranças da escola teriam levado ele sozinho para ser punido pela diretoria. Já outra mãe, responsável por uma estudante da 4ª série do ensino fundamental, diz que o colégio estimula a saída de alunos que não sejam do “padrão Liceu”. Um estudante do 2º ano do ensino médio diz que a escola deseja criar “robôs padronizados que sabem decorar matéria, mas não sabem pensar”.
Em novembro de 2018, uma professora de história do colégio alegou ter sido demitida após dizer a alunos que não iria votar no então candidato à Presidência da República Jair Bolsonaro, alinhado às posições políticas defendidas pela escola. A docente ingressou na Justiça com ação por danos morais. Entretanto, o pedido foi negado pela 11ª Turma do TRT-2 (Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região), que entendeu que a falta da professora em aulas justificava a demissão.

A Ubes (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas) estuda ingressar com ação judicial contra o colégio por conta das declarações dadas na reunião. Um protesto de pais e alunos seria organizado nesta semana, mas teria sido desmobilizado após pressão da escola.
O educador Mateus Prado, responsável pela página no Instagram que divulgou o áudio, diz que irá registrar BO (Boletim de Ocorrência) contra o diretor. “Foi um festival de homofobia, aporofobia (aversão a pessoas de baixa renda), racismo e fake news. Não tem como uma escola com tanta tradição não se importar com o julgamento público que ela vai passar por o que se falou na reunião”, afirmou.

‘Liceu é uma escola judaico-cristã’

O Diário questionou o dono do Liceu Jardim sobre o conteúdo do áudio. Daniel Contro, que foi secretário de Educação de São Caetano na gestão do ex-prefeito Paulo Pinheiro (DEM), negou os relatos sobre o ambiente da escola e disse que a reunião tem sido alvo de exploração ideológica.

“Veja o caso da professora. Foi demitida por abandono de emprego. Perdeu o processo em todas as instâncias. Nosso regimento proíbe explicitamente o namoro, seja de (um indivíduo) hétero ou homoafetivo. Tratamento desigual pela cor da pele? Isso é crime inafiançável”, desconversou.

Contro confirmou as declarações feitas na reunião e diz ter ouvido pais preocupados com alunos que passam por crise de identidade sexual. “O homossexualismo sempre existiu e existirá. Há discussão que se torna até promoção (da orientação homossexual)”, criticou.
Contro defende a pluralidade entre diversas escolas particulares. “(Se) Tem uma escola que é mais liberal, (há uma) mais conservadora. O Liceu é uma escola judaico-cristã, que acredita na família tradicional. Não vai haver banheiro neutro, a não ser por força de lei”, afirmou em relação a sanitários que podem ser utilizados por quaisquer pessoas, reivindicação de movimentos LGBTQIA+ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais, Travestis, Queer, Intersexo e Assexuais).

Pais ouvidos pela equipe reportagem concordam com os valores defendidos pela escola e negam que tenha havido demonstrações de preconceito na reunião. “Certamente a fala do professor foi equivocada e algumas pessoas citaram frases fora do contexto. Ele enfocou a importância de proteger nossas crianças de extremismos. A diversidade existe e isso é percebido por nós dentro da escola”, relata Fabrício Savoia, 42 anos, pai de um aluno e de uma aluna do ensino fundamental.

O diretor ressaltou que é contra os regimes totalitários que estariam presentes na Rússia e na China, países citados por ele na reunião. Ainda pontuou que a reunião teve caráter orientativo em relação às ideias políticas disseminadas pelo colégio. “Aqui nenhum aluno é impedido de fazer matrícula, mas a escola se posiciona”, finalizou. AG

DGABC


Deixe um comentário ou dica do que gostaria que pudéssemos trazer de novidade para vocês. E se curte nosso CANAL faça uma doação de qualquer valor para que possamos continuar com esse trabalho.

PIX: (11) 98321-7790
PayPal: [email protected]

TODO APOIO É IMPORTANTE.

Compartilhar.

Sobre o Autor

DEIXE UM COMENTÁRIO

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.