Lisboa, a menina dos olhos de ouro do turismo LGBTI

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Autor: Leonor Santos

Uma cidade, sete colinas, 24 freguesias. Lisboa está moda e não sai do radar. O turismo está ao rubro. Cá dentro e lá fora: ninguém fica indiferente aos encantos da “menina e moça”. A capital portuguesa sabe receber e está viva, mais do que nunca. E Lisboa destaca-se também por ser uma cidade inclusiva, que abraça orgulhosamente a diferença. Em 2017, o portal imobiliário Nestpick colocou Lisboa em 15º lugar numa lista de 100 cidades gay-friendly. E porquê?

“Lisboa é, de facto, uma cidade friendly, tal como Portugal é percebido como sendo um país friendly. Há muita legislação que reconhece, e bem, os direitos fundamentais das pessoas LGBTI (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais, Transgéneros e Intersexo). Temos o casamento igualitário, a questão da parentalidade e os direitos para as pessoas trans – a lei que permite a mudança de nome e sexo no registo”, explica a diretora-executiva da associação ILGA Portugal – Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual, Trans e Intersexo, Marta Ramos, em entrevista ao idealista/news.

“Somos cada vez mais contactados por estrangeiros, casais ou pessoas individuais que vêm passear e depois decidem morar em Portugal, são LGBTI, e vêm à procura de associações, serviços, locais para viver”, acrescenta a responsável, garantindo que “há de facto muitas pessoas LGBTI a vir para Portugal”.

Portugal está, aliás, no Top 10 dos países mais LGBTI-friendly da Europa. Ocupa a sétima posição no “2018 Rainbow index and Map” (“Mapa Arco-íris da Europa 2018”). O ranking, elaborado pela plataforma Rainbow Europe, uma ferramenta da ILGA Europe, que avalia as leis e políticas de 49 países europeus.

A 15ª cidade mais gay-friendly do mundo

E, em 2017, o portal imobiliário Nestpick colocou Lisboa em 15º lugar numa lista de 100 cidades gay-friendly. Para avaliar as cidades e elaborar o ranking “Best LGBT Cities 2017” foram considerados cinco fatores: vida noturna LGBTI, a mente aberta dos habitantes, a segurança, os direitos LGBTI e o “gay dating” (“encontros gay”).

Madrid ocupa o primeiro lugar na lista, seguida de Amesterdão e Toronto, no segundo e terceiro lugares, respetivamente. Lisboa salta à vista, no 15º lugar, e é a única cidade portuguesa a dar o ar de sua graça no ranking.

A cidade, que por vários motivos está na moda, é assim um destino cada vez mais procurado pela comunidade LGBTI. Segundo dados da associação Associação de Comércio e Turismo LGBTI, Variações, ao milhão de consumidores LGBTI existente em Portugal podem somar-se mais de dois milhões de turistas LGBTI que visitam o país anualmente. Os números são bons, mas podem ainda ser melhores. O objetivo dos responsáveis do projeto é levar Portugal além-fronteiras e promover uma candidatura para que o país possa receber o EuroPride 2021.

Os sinais positivos não se ficam por aqui. E os números multiplicam-se. O Arraial Lisboa Pride – o maior evento LGTBI em Portugal –, organizado pela ILGA, em parceria com a Câmara Municipal de Lisboa, a EGEAC, a Junta de Freguesia de Santa Maria Maior e a Junta de Freguesia da Misericórdia, recebeu cerca de 60.000 visitantes ao longo das 12 horas de programação na edição do ano passado.

A 22ª edição da festa mais colorida de Lisboa está de regresso e já tem data marcada: a principal praça da cidade de Lisboa, o Terreiro do Paço, vai receber no dia 23 de junho (sábado) o novo arraial, realizado das 16h00 às 04h00.

“Boom” turístico para o bem e para o mal?

Não resta margem para dúvidas de que Lisboa é um verdadeiro epicentro do Turismo em Portugal. Só no ano passado os proveitos globais do alojamento turístico na região de Lisboa aumentaram 21,6%, para 1.065,6 milhões de euros: a capital ultrapassou pela primeira vez a barreira dos 1.000 milhões, segundo dados do Instituto Nacional de Estatístisca. O turismo assumiu-se como a galinha dos ovos de ouro portuguesa: está de boa saúde e recomenda-se, mas até quando?

A verdade é que os efeitos do turismo se fazem sentir um pouco por toda a cidade: para o bem e para o mal, parece ser. De um lado uma Lisboa “friendly”, e do outro uma Lisboa que tem de lidar com o “boom imobiliário” e a escalada de preços. A freguesia da Misericórdia, onde está o bairro mais gay-friendly da cidade – o Príncipe Real – é uma das mais caras de Lisboa. A presidente da junta de freguesia, Carla Madeira, olha para este cenário com preocupação.

“Este crescimento do turismo tem, naturalmente, efeitos positivos na economia da cidade e do país, mas também tem efeitos negativos. E esta zona está a senti-lo. Estamos a falar da gentrificação, do facto das pessoas terem de sair destas zonas. O Alojamento Local (AL), por exemplo, está a crescer de forma desmesurada, e acho que se continuar a crescer desta forma esta zona vai perder o encanto que tem, e esse é um risco que existe”, salienta Carla Madeira, em entrevista ao idealista/news.

“Vejo com preocupação a saída de moradores, os preços exorbitantes que estão a ser praticados”, acrescenta, declarando que “os turistas vêm à procura das pessoas que estão cá, da autenticidade que esta zona tem”. A presidente deixa um aviso: “este é um problema que precisa de resolução urgente sob pena de virmos a ter estes bairros completamente descaracterizados e isto ser uma espécie de disneyland”.

“Tive de sair da casa, porque o senhorio decidiu fazer AL do prédio inteiro”

Comprar ou arrendar casa não está fácil na capital. Que o digam Nuno Pinto e João Valério,moradores do Príncipe Real, e Nuno Nolasco,morador em Alfama. As três vozes – que se juntam a muitas outras da comunidade LGBTI –  falaram com o idealista/news e, pelo que dizem, pode concluir-se: o turismo é uma moeda de duas caras.

João Valério vive numa casa arrendada e partilhada (com outra pessoa). Uma situação que acontece, garante, muito por culpa “do aumento de preços” que a zona onde vive está sofrer e pela gentrificação que existe. Já arrendou quatro casas na mesma zona, na mesma travessa, aliás. Da última vez teve de abandonar a casa porque “o senhorio decidiu fazer AL do prédio inteiro”.

“Eu sinto muito na pele, porque sou morador da zona, os efeitos deste boom turístico e do que isso traz, como a gentrificação”, conta Nuno Pinto. É morador na zona e tem “mixed feelings” sobre o momento que a cidade está a viver.

“Eu gosto da ideia de Lisboa se tornar numa cidade cosmopolita à semelhança de outras cidades. E o turismo tem muito essa vantagem, nomeadamente nas questões LGBTI. Mas também traz com ele outros efeitos, seja a dificuldade em encontrar casa para arrendar ou comprar, seja ao nível do comércio local – muitos estabelecimentos fizeram obras para se adaptarem apenas e só aos turistas. Hoje em dia tenho de ir fazer compras mais longe”, explica.

Nuno Nolasco, que vive em Alfama, partilha o sentimento de preocupação. “O boom imobiliário na cidade acho que é um problema a ter em conta, o que está a acontecer já não é uma novidade nas grandes capitais europeias, mas no nosso caso eu acho que temos algumas coisas a menos que nessas capitais”.

“Aquilo que é atrativo em Portugal a meu ver são os portugueses. Lisboa vive pelos portugueses estarem aqui. As rendas e a compra de casa estão difíceis, os preços estão altos e a verdade é que os portugueses estão a ter de sair dos bairros históricos. Em último caso, este cenário pode levar a uma descaracterização da cidade que, a meu ver, ainda não está preparada para receber tanta gente”, sublinha o morador de Alfama. “As outras cidades foram ficando preparadas e nos ainda não estamos e isso faz com que as pessoas que vivem no centro tenham de ir para as periferias”, remata.

 

https://www.idealista.pt/news/ferias/turismo/2018/06/18/36537-lisboa-a-menina-dos-olhos-de-ouro-do-turismo-lgbti


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