Elas nasceram com o sexo biológico masculino, mas discutem a transição para o feminino desde antes da maioridade.
Duas gêmeas de 19 anos realizaram cirurgia de readequação de sexo em um hospital de Blumenau, no Vale do Itajaí. Elas nasceram com o sexo biológico masculino, mas discutem a transição para o feminino desde antes da maioridade. O hospital informou que a cirurgia de uma delas terminou na noite de quarta-feira (10). A outra irmã foi operada nesta quinta (11).
Antes de ser submetido à cirurgia, o paciente precisa passar por acompanhamento multidisciplinar por cerca de dois anos. As gêmeas fizeram a cirurgia pela rede particular, mas o procedimento é disponível pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Dos cinco hospitais públicos brasileiros que prestam esse serviço, nenhum é em Santa Catarina. A espera no país para iniciar o processo pode levar até cinco anos.
Segundo o hospital, as gêmeas passaram por acompanhamento psicológico e orientações médicas. As duas começaram o tratamento hormonal por volta dos 15 anos.
A cirurgia feita na quarta-feira durou cinco horas, mesmo tempo que o procedimento da irmã, realizado nesta quinta. As duas estão de repouso no mesmo quarto e ficarão internadas por três dias, conforme o hospital.
Os médicos José Carlos Martins Junior e Cláudio Eduardo, especializados em cirurgia trans e feminização facial, foram os responsáveis pelo procedimento cirúrgico realizado no Hospital Santo Antônio. Segundo a unidade, é a primeira vez que gêmeas passam por esse tipo de procedimento no país.
Cirurgia é último recurso procurado
Para o pesquisador Rodrigo Moretti, professor e pesquisador do departamento de Saúde Pública da Universidade Federal de Santa Catarina (Ufsc), do Núcleo de Estudos em Gênero e Saúde, a busca de pessoas transexuais interessadas em fazer a cirurgia de readequação de sexo diminuiu nos último anos.
Isso porque antes do decreto nº 8.727 de abril de 2016, que trata sobre o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas travestis ou transexuais, a cirurgia era obrigatória para que a pessoa pudesse modificar seus documentos.
“A cirurgia é o último recurso, muitas vezes a população necessita só da modificação das características secundárias, que o uso de hormônio às vezes dá conta, sem a necessidade de alteração genital”, afirmou Rodrigo Moretti.
Procedimento pelo SUS
É a portaria nº 2.836 de dezembro de 2011, que instituiu a Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, que trata sobre o direito da cirurgia de readequação de sexo e o uso de hormônios. O objetivo geral da portaria é promover a saúde integral da população LGBT.
Para realizar a cirurgia de readequação de sexo pelo Sistema Único de Saúde (Sus), o acesso inicial é via Unidade Básica de Saúde (UBS). Após esse primeiro contato, é função da rede estadual direcionar essa pessoa para um dos centros de referência habilitados pelo Ministério da Saúde que realizam o procedimento.
São nestes hospitais que as pessoas transexuais serão acompanhadas, por em média dois anos, por uma equipe multidisciplinar.
No Brasil, cinco hospitais prestam esse serviço para a população. Nenhum deles fica em Santa Catarina.
“Os mais próximos do estado ficam em Porto Alegre e São Paulo. Tem também um no Rio do Janeiro, em Pernambuco e Goiás. Cada um dos centros realiza no máximo duas cirurgias como essas por mês. Então, isso dá uma média 10 procedimentos por mês e isso é muito aquém da necessidade. É uma situação precária”, disse Rodrigo.
Primeira cirurgia
A primeira cirurgia no Brasil foi anterior a qualquer resolução oficial. Ela foi feita em 1971 pelo cirurgião Roberto Farina, que chegou a ser condenado por isso. Farina também fez a primeira cirurgia em um homem transexual no Brasil – o paciente foi o psicólogo e escritor João Nery, autor do livro “Viagem solitária – memórias de um transexual 30 anos depois”.
Já a primeira cirurgia de redesignação sexual na rede pública no Brasil foi realizada em 1998, no Hospital das Clínicas da Universidade Estadual de Campinas. Na época, o procedimento só foi possível após a resolução 1482/97 do CFM. A primeira mulher trans a ser operada pela rede pública de saúde foi Bianca Magro, em 1998.