Jairo Ferreira Júnior, do TJGO, é alvo de representação por chamar homossexualidade de “perniciosa”, durante sessão transmitida pelo Youtube.
Na reclamação, as entidades destacaram que, durante sessão online na última quarta-feira (9/3), o desembargador cometeu o crime de racismo homotransfóbico, o que, segundo o documento, não é protegido pelos direitos fundamentais à liberdade de expressão. O julgamento foi transmitido pelo canal do TJGO no Youtube.
“Os senhores e senhoras já viram a coisa mais perniciosa e vulgar que é a Globo? De mostrar, propagar e enaltecer o homossexualismo [sic]. Mulher com mulher se beijando lá, homem com homem se beijando. Perniciosa”, disse o desembargador, durante sessão online da Corte Especial do TJGO, ao lado de outros desembargadores.
Veja vídeo abaixo:
Entidades reagem
A reclamação disciplinar, protocolada pelo advogado Paulo Roberto Iotti Vecchiatti, foi apresentada pelas seguintes entidades ao CNJ:
- Associação Brasileira Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT);
- Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra);
- Associação MÃES pela Diversidade;
- Associação Brasileira de Mulheres Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABMLBT);
- Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual e de Gênero (GADvS).
“Perversão”
As entidades ficaram ainda mais incomodadas porque, durante a apresentação de seu voto, o desembargador continuou suas críticas, usando “homossexualismo”, e não homossexualidade, para se referir a pessoas que se relacionam com outras do mesmo sexo.
“Nós temos que aderir simplesmente porque houve uma evolução no aspecto dos costumes sexuais. Não vou dizer que a coisa ficou pervertida porque antigamente a perversão existia e, talvez, até mais que hoje, mas era escondida”, afirmou Jairo, na sessão de julgamento do TJGO.
Além disso, durante a apresentação de seu voto, o desembargador reforçou o uso de expressões consideradas machistas. “O cara que era homossexual não saía do guarda-roupa. Hoje sai, pronto e acabou. Sai de mão dada lá no shopping center, de mão dada um com o outro companheiro, e ninguém tá [sic]nem aí”, afirmou Jairo.
Ataque à dignidade
Na reclamação, as associações apontam que o desembargador atacou a dignidade de todas as pessoas homossexuais, ao qualificar pessoas que se relacionam com outras do mesmo sexo como supostamente praticantes de uma “perversão” e condenando como algo supostamente socialmente pernicioso a manifestação pública de afeto homoafetivo.
“A fala do desembargador inequivocamente é um discurso de ódio, porque incita ao preconceito, à discriminação e à segregação de pessoais homossexuais e bissexuais assumidas relativamente a heterossexuais, pois obviamente visa difundir a crença de suposta ‘anormalidade’ e ‘perniciosidade’ da homossexualidade e da bissexualidade ao condenar singelas demonstrações de afeto homoafetivo em telenovelas”, diz a reclamação.
Passo a passo no CNJ
Depois de avaliar o caso, a corregedora nacional de Justiça, ministra Maria Thereza de Assis Moura, apresentará, em plenário, relatório com sugestão de arquivamento ou abertura de processo administrativo disciplinar (PAD) contra o desembargador.
No dia da sessão, os demais conselheiros votam, acompanhando ou não a corregedora nacional de Justiça. Se confirmada transgressão por parte de Jairo, segundo a Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman), ele deverá receber sanção, que poderá ir desde uma advertência até aposentadoria compulsória.
Os PADs são instaurados com a finalidade de apurar responsabilidades de magistrados, de servidores e de titulares de serviços notariais e de registro por infração disciplinar. Por isso, não preveem punições na esfera da legislação criminal.
“Liberdade de expressão”
O TJGO não quis se manifestar sobre a reclamação contra o desembargador enviada ao CNJ. Em nota, a Associação dos Magistrados do Estado de Goiás (Asmego) informou que “sempre defenderá o direito do magistrado de ser respeitado no exercício de suas funções e, também, a liberdade de decisão conferida aos juízes e desembargadores”.
A associação ressaltou, ainda, que é assegurada ao magistrado independência funcional e liberdade de expressão no exercício da fundamentação das decisões e explanação durante as sessões. “O meio processual legítimo para se questionar decisões ou condutas é o recursal”, disse a nota.
O Metrópoles também solicitou resposta do desembargador, por meio das assessorias do TJGO e da Asmego, mas não obteve retorno dele.