Cirurgia de redesignação sexual passa a ser permitida aos 18 anos

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Com atualização de resolução, hormonoterapia passa a ser autorizada pelo CFM aos 16 anos; movimentos fazem ressalvas, mas comemoram inclusão na saúde.

Por Alex Bessas

O Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou uma resolução que reduz de 21 para 18 anos a idade mínima para que pessoas transgênero tenham acesso a cirurgias de redesignação sexual. A norma também passa a permitir a hormonoterapia aos 16 anos, ante 18, e cria regras para o uso de medicamentos para bloqueio hormonal da puberdade. As mudanças são comemoradas por pessoas e movimentos trans e travestis, mas há ressalvas, principalmente, em relação ao entendimento da transexualidade por um viés patológico.

“Embora o CFM não tenha hábito de dialogar com movimentos sociais, pesquisadores conseguiram intermediar um diálogo entre o conselho e o nosso movimento. Essas mudanças de agora estão entre as demandas que a gente levou”, expõe Keila Simpson, presidente da Associação Nacional de Travestis e Transsexuais (Antra). Ela lembra que o Ministério da Saúde ainda precisa definir quais alterações serão adotadas em relação à rede pública: “Temos que ver o que vai ser ou não homologado”.

Mesmo reconhecendo avanços, Keila não comemora o texto da resolução. “Há imbricações sérias em relação a patologização: laudos, acompanhamento, decisões psiquiátricas na vida de pessoas trans é algo reafirmado nessa publicação e que vamos debater e buscar formas de minimizar”, critica.

Um dos aspectos mais celebrados por Keila é que mais pessoas estarão integradas ao sistema de saúde, “sem precisar recorrer a alternativas artesanais, caseiras e perigosas”. Como para muitas pessoas trans, essas soluções domésticas foram presentes na vida do filósofo Raul Alvim Capistrano, 38, que se aplicou hormônios por cerca de cinco anos. “Para nós, não existe isso de quando descobrimos a transexualidade, mas, sim, quando descobrimos a possibilidade de transicionar. No meu caso, foi em 2010, aos 28 anos”, diz. Ele lembra que, à época, buscou a rede pública para iniciar a terapia hormonal, sem êxito.

“Fiz a minha mastectomia em uma clínica particular, em 2011. Os hormônios, apliquei por conta própria, até 2015, quando passei a ter algum acompanhamento”, conta. Uma assistência efetiva e multidisciplinar só viria em 2017, com a abertura do Ambulatório de Saúde Integral da População de Travestis e Transexuais, mais conhecido como Ambulatório Trans Anyky Lima, que funciona no Hospital Eduardo de Menezes.

Capistrano aguarda, agora, a marcação de uma histerectomia. Ele recorre à própria trajetória para destacar o que considera a principal conquista com a resolução: “Hoje, ainda falta infraestrutura, são poucas as clínicas credenciadas e menos ainda as que fazem cirurgias. É preciso esperar anos. Chegando mais cedo à fila, mais cedo se sai dela”.

Minientrevista

Dalcira Ferrão

Psicóloga clínica social e conselheira federal de psicologia

Trabalhando com pessoas trans e travestis há dez anos, como avalia as mudanças?

Essas mudanças são mais lentas e ficam aquém das demandas. O Sistema Único de Saúde (SUS) passou a oferecer terapia hormonal e cirurgia de redesignação de gênero em 2008, mas resumia-se apenas a travestis e mulheres trans. Só em 2013 temos a inclusão dos homens trans. Além disso, apesar de a legislação garantir o uso nome social na saúde desde 2009, não é algo que funcione direito. Agora, temos essa mudança que traz pontos relevantes, mas ainda deixa a desejar.

O que você classificaria como um avanço?

É positiva a diminuição da idade para a cirurgia de redesignação de gênero e para início da terapia hormonal, sendo possível, antes disso, a intervenção com bloqueadores hormonais. Há um aumento dos casos de trans com idades menores, e a mudança facilita o tratamento nesse sentido. Houve inclusão de um acompanhamento aos familiares para casos de pessoas que estiverem de acordo, algo que percebo como básico e necessário

E o que identifica como problemático?

Não existe o autorreconhecimento de trans e travestis para a medicina, que coloca a questão pela via do diagnóstico – algo que aponta para um entendimento dessas expressões identitárias como patologias. Resumir a identidade travesti como pessoa que nasce no sexo masculino, se reconhece no feminino, mas não sente desconforto em relação a genitália também é problemático por ignorar a dimensão política dessa identidade. Um outro incômodo é compreender o processo de transição de gênero como se tivesse começo, meio e fim – sendo concluído com a cirurgia de redesignação sexual e situando a terapia hormonal apenas como uma etapa. Logo, pessoas que querem passar pela hormonoterapia sem realizar o procedimento cirúrgico ficam excluídas. Acho que falta ao conselho ouvir os movimentos travesti e trans.

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