“Os meus colegas apertavam-me o pescoço por eu ser gay”

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Estudo pedido pela Associação ILGA mostra que a maioria dos estudantes homossexuais já ouviu comentários negativos de professores ou auxiliares. Muitos deles têm medo de ir aos balneários e casas de banho

As escolas portuguesas são cenários de “insegurança e desconforto” para os alunos homossexuais. A maioria dos estudantes LGBTI (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e transgéneros, intersexuais) já foram insultados por causa da sua orientação sexual e mais de metade também já ouviu comentários homofóbicos de professores ou auxiliares. O estudo realizado pelo ISCTE e pela Universidade do Porto para a ILGA mostra ainda que um terço dos jovens evita mesmo frequentar os balneários e um quarto tem medo de ir às casas de banho, por insegurança ou desconforto. Há mesmo relatos de agressões físicas.

“Os meus colegas apertavam-me o pescoço por eu ser gay”; “fui espancada por estar na Marcha LGBTI”; “Fui repetidamente agredida”. Cerca de 8% dos 663 jovens entre os 14 e os 20 anos que responderam ao inquérito garante já ter sido vítima de agressões físicas (murros, pontapés ou agressão com objetos ou armas) por causa de características pessoais: 7,7% das situações por causa da sua expressão de género (forma de vestir relacionada com sexo oposto), 7,4% por causa da sua orientação sexual e 4,4% por causa da sua identidade de género. Dois terços (66,7%) afirmaram ter sido alvo de agressões verbais e cerca de um em cada seis sofreu assédio físico (por exemplo, abanões ou empurrões). E quase metade (45,4%) refere ter sofrido assédio sexual (tais como toques não consentidos ou comentários de teor sexual).

Ficou parado a um metro de nós com a mão dentro das calças, como se se estivesse a tocar. Depois reparámos que os amigos estavam a gravar e que aquilo era uma espécie de partida para nós

“Ficou parado a um metro de nós com a mão dentro das calças, como se se estivesse a tocar. Depois reparámos que os amigos estavam a gravar e que aquilo era uma espécie de partida para nós”. Os relatos repetem-se no estudo, com outros estudantes a a denunciarem convites para sexo a três ou uma situação que “um rapaz gay foi extremamente gozado por espalharem nudes e vídeos íntimos dele”. Quase um quarto (23,6%) foi vítima de cyberbullying e 22% sofreu dano ou furto de bens pessoais.

Mais de metade dos jovens entrevistados (55,6%) afirmou que, nas situações em que estavam presentes professores ou auxiliares, nenhum interveio. Quando se tratava de colegas, apenas em 17,3% dos casos intervieram. A maioria (61,1%) ouviu comentários homofóbicos na escola de forma regular ou frequente. Para três quartos (75,1%) da amostra, esses comentários são feitos por colegas, mas três quintos (62,0%) também os ouviu de professores ou auxiliares. “Os meus professores são extremamente machistas, misóginos e fazem frequentemente comentários machistas e homofóbicos”; “Já sofri de muito preconceito por (…) quer professores, funcionários ou alunos”; “Cheguei a sentir uma extrema vontade de abandonar a aula por algo que um professor disse”, relatam alguns dos alunos. Outros retratam insultos ouvidos de colegas. “Um rapaz disse que eu era “nojenta” por gostar de raparigas”; “Chamavam me nomes horríveis, fiquei traumatizado”; “nesse mesmo ano obtive pensamentos suicidas”.

Os meus professores são extremamente machistas, misóginos e fazem frequentemente comentários machistas e homofóbicos

Como resultado deste ambiente, pelo menos um estudante LGBTI em cada seis (15,4%) faltou às aulas no último mês por sentir insegurança ou desconforto. Este Estudo Nacional sobre o Ambiente Escolar revela ainda que quando o número de pessoal docente e não docente que apoia estudantes LGBTI é maior, aumenta também a perceção de aceitação por parte da população estudantil, com uma diferença de 71,2% para 44,4%. “Quanto mais inclusiva e aberta à diversidade for a escola, menor parece ser a prevalência da discriminação, assim como o seu impacto, o que parece evidenciar a necessidade de investir em mais recursos, mais formação especializada, mais sensibilização e mais capacitação de jovens e pessoal docente e não docente contra a discriminação em função da orientação sexual, identidade ou expressão de género e características sexuais”, lê-se no estudo.

O apoio nas escolas
Pelo lado mais positivo, a investigação mostra que mais de metade (57,4%) dos estudantes ouvidos considera que a população estudantil da sua escola aceita as pessoas LGBTI, e quase três quartos (72,5%) que existe um número considerável de estudantes LGBTI na sua escola. A esmagadora maioria (93,3%) é capaz de identificar pelo menos um elemento do pessoal docente ou não docente da escola que apoia estudantes LGBTI, e metade (50%) consegue mesmo identificar seis ou mais pessoas apoiantes.

Entre as recomendações apresentadas neste documento da Associação ILGA Portugal – Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual, Trans e Intersexo, contam-se “aumentar a visibilidade de temáticas LGBTI nas atividades escolares”, “respeitar a identidade de jovens trans, reconhecendo logo que possível o seu nome social e o direito à utilização adequada de espaços comuns (por exemplo, balneários e casas de banho)”, ou “incluir temáticas LGBTI na formação de futuro pessoal docente e não docente da escola”.

No estudo participaram 663 jovens entre os 14 e os 20 anos (com idade média de 16,2) – dois terços deles (67,2%) residentes em zonas urbanas e cinco em cada seis (84,4%) a frequentar o ensino público – e foram ouvidas no final do ano letivo 2016/2017. Esta iniciativa que teve o apoio da GLSEN (Gay, Lesbian and Straight Education Network), e foi feita em parceria com o Centro de Investigação e Intervenção Social do ISCTE-IUL e o Centro de Psicologia da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto, com base na proposta original e assessoria da GLSEN e da Columbia Teachers College.

No contexto europeu, Portugal surge em 15º lugar no Index da Educação Inclusiva LGBTQI da International Lesbian, Gay, Bisexual, Transgender, Queer & Intersex Youth and Student Organisation (IGLYO, 2018), que considera “o enquadramento legal relativamente inclusivo”, embora careça “de medidas concretas de implementação” para a promoção da inclusão e segurança nas escolas.


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