Operação Fada Madrinha apontou que dupla aprisionava 13 pessoas, as obrigava a se prostituir para pagar diárias e levava vítimas a contrair dívidas para aplicação de silicone industrial.
Por G1 Ribeirão Preto e Franca
A Justiça do Trabalho condenou os empresários Anderson Barbosa e Hudson Barbosa da Silva, de Franca (SP), a pagar R$ 1,755 milhão por danos morais e indenizações trabalhistas a 13 transexuais exploradas sexualmente e supostamente submetidas a trabalho análogo à escravidão. Cabe recurso.
Ambos foram presos em agosto de 2018 durante a Operação Fada Madrinha, deflagrada pela Polícia Federal (PF), Ministério Público do Trabalho (MPT) e o Ministério Público Federal (MPF), que investigavam esquema de tráfico internacional de transexuais brasileiras.
Em dezembro, os dois foram colocados em liberdade por decisão da juíza Adriana Galvão Starr, da 2ª Vara Federal de Franca, que também decretou o sigilo dos processos. Desde então, Silva e Barbosa devem se apresentar à Justiça mensalmente.
O Tribunal Regional do Trabalho (TRT) – 15ª Região, em Campinas (SP), informou na tarde desta quarta-feira (13) que os dois não constituíram advogados durante todo o processo e também não compareceram às audiências na Justiça do Trabalho em Franca.
Na sentença, assinada em 30 de janeiro, a juíza Eliana dos Santos Alves Nogueira afirma que “os réus, apesar de devidamente citados, não apresentaram defesa no prazo concedido, sendo, em consequência, declarados revéis e confessos quanto à matéria de fato”.
Condenação
As investigações da PF concluíram que as transexuais traficadas para a Europa eram mantidas aprisionadas em uma casa em Franca e obrigadas a se prostituir para pagar diárias de R$ 170. Caso não obtivessem o valor, as vítimas eram agredidas com barras de ferro.
As diárias eram referentes a R$ 70 para hospedagem e alimentação, R$ 50 para aquisição de roupas, perucas, sapatos e outros acessórios e os outros R$ 50 da chamada “poupança da transição”, para financiar os procedimentos, como prótese mamária e silicone industrial.
Segundo a juíza do trabalho, os documentos apresentados pelo MPT comprovam o vínculo empregatício: 13 transexuais citadas no processo foram aliciadas “para prestação de serviços de natureza sexual, em proveito econômico dos reclamados”.
PF diz que transexuais eram exploradas sexualmente em casa em Franca, SP — Foto: Stella Reis/EPTV
A magistrada cita ainda na sentença que Barbosa aplicava silicone industrial nas vítimas e as extorquia ao cobrar entre R$ 500 e R$ 1 mil por litro do produto, o que levava algumas das transexuais a contrair dívidas que somava R$ 5 mil.
Os empresários devem arcar com salários retroativos estimados em R$ 3 mil a cada vítima, além de verbas trabalhistas, rescisórias e multas, além de indenização por danos morais individuais e coletivos. Os valores somados chegam a R$ 1,755 milhão.
Investigação
As investigações tiveram início em novembro de 2017, após vizinhos da casa em Franca registrarem um boletim de ocorrência por perturbação de sossego e da ordem. Na ocasião, várias transexuais foram levadas para a delegacia e, em depoimento, relataram o esquema.
A procuradora do trabalho Regina Duarte da Silva diz que, nessa ocasião, o MPT identificou que uma transexual já havia sido traficada para a Itália. Além disso, segundo Regina, a exigência da prostituição para quitação das dívidas configurava escravidão.
A PF, o MPT e o MPF apontaram que todas as transexuais eram aliciadas pelas redes sociais mediante promessas de transformação corporal para a participação em concursos de beleza. Algumas delas eram submetidas a cirurgias.
Nesses procedimentos, os réus autorizavam o uso de próteses mamárias reaproveitadas ou de baixíssima qualidade. Também era aplicado silicone industrial – usado para lubrificar maquinários e motores – nas nádegas, nas pernas e no rosto das vítimas.
Ainda em agosto, a 2ª Vara do Trabalho de Franca concedeu seguro-desemprego às 13 vítimas do esquema, independente de anotação do contrato em carteira de trabalho, e determinou o bloqueio de R$ 300 mil em ativos financeiros dos réus, além do bloqueio de veículos e imóveis.
O valor bloqueado será utilizado para o pagamento de verbas relativas à rescisão indireta de contrato de trabalho.